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Foto do escritorAlex Fraga

Crônica - A Cachorra-gato em: um caso de dupla personalidade, por João Francisco Santos da Silva



Sábado no Blog do Alex Fraga é dia de crônica com o médico clínico geral, acupunturista e escritor, João Francisco Santos da Silva, com "A Cachorra-gato em: Um caso de dupla personalidade".


A Cachorra-gato em: um caso de dupla personalidade


Lugares mágicos existem e precisam de limpeza. Na casa da mentora da cachorra Pipoca também é assim. A câmara secreta é limpa uma vez por semana. Em um desses dias, depois da faxina semanal, a bruxa mentora, por descuido, se esqueceu de apertar o botão vermelho que abre e fecha a passagem para a câmara secreta.

Pipoca, já meio cega, entrou de gaiata na câmara secreta pensando ser o quarto de yoga. A cachorrinha, sempre ansiosa, pretendia apenas fazer uma meditação autoguiada para relaxar um pouco. Ela deitou-se no tapete central da câmara e, após meio minuto de meditação, caiu em sono profundo.

Como sempre, depois de uma prolongada soneca, Pipoca acordou sem noção de onde estava. Estabanada, a cachorrinha bateu e virou um frasco de poção mágica transformadora. Por sorte, o frasco continha apenas poucas gotas que caíram em suas patas dianteiras. Depois de lamber as patas, Pipoca saiu da câmara secreta como se nada tivesse ocorrido.

No dia seguinte, Pipoca amanheceu sentindo-se meio estranha e sem entender o que acontecia. Primeiro ela espreguiçou-se longamente. Até aí sem novidade. Então, lhe veio uma tontura diferente. Ela sempre foi meio tonta, mas não daquele jeito. Pipoca estava sem o tapa olho que costumava usar. Nesse momento, ela percebeu que além de abrir o olho doente, conseguia também enxergar muito bem com ele.

Em seguida, para sua surpresa, pela primeira vez depois de muito tempo, ela pode manter a sua boca fechada. Desde que começou a tomar remédios para os nervos, Pipoca ficou com a boca meio flácida e a língua sempre solta para fora.

De tão empolgada que estava com as novidades, Pipoca quis se levantar da cama num salto. Mas, ficou só na intenção, suas pernas traseiras não deram conta do esforço. Mesmo com as pernas fracas, até que para uma cachorrinha idosa de 12 anos, ela estava se sentido muito bem.

O dia prometia ser cheio de emoções. Pipoca foi para a cozinha mais animada do que nunca. E ainda bem que ela não se viu no espelho. Pois, ela veria um bicho muito estranho, metade cachorra, metade gata.

A metade da frente de seu corpo, incluindo parte do tronco, patas dianteiras, cabeça e pescoço eram de um gato preto. Ou melhor, era da gata preta Sabá. Enquanto que a parte de trás continuava sendo de Pipoca, com pelo branco, uma grande mancha preta no final das costas, o rabo pítoco encurvado para baixo e as pernas traseiras um pouco arqueadas e vacilantes.

No começo foi tudo muito esquisito e bagunçado. Pois, a mente da gata e da cachorra funcionavam ao mesmo tempo. Assustada, a gata quis miar e saiu apenas um pigarro rouco, típico dos engasgos de Pipoca. Então, Sabá respirou fundo e tentou saltar para o telhado de casa. Quando tinha algum problema difícil para resolver, lá no alto parecia que as soluções surgiam mais fáceis. Mas, sem chance. No primeiro impulso que deu para saltar, estatelou-se no chão. Com aquelas patas traseiras fracas da cachorra, seria impossível subir no telhado.

Sabá tinha um pouco mais de inteligência emocional que Pipoca e conseguiu organizar para que cada uma delas pensasse uma coisa de cada vez. E por falta de ideia melhor, decidiu seguir a vontade da cachorrinha.

Pipoca estava empolgada, pois conseguia enxergar melhor do que nunca. Ela teve vontade de ficar sentada pelo lado dentro do portão lateral da casa. Lá ela poderia observar o movimento da rua, coisa que há muito tempo não conseguia fazer.

A cachorra-gato estava entretida e tranquila nesse passatempo de olhar a rua, quando de repente, a parte Pipoca agitou-se. Demorou um pouco para Sabá sacar qual era o problema com sua parceira de corpo. Do outro lado da rua vinha caminhando um antigo desafeto de Pipoca, o detestável gato siamês cinza. No último encontro entre eles, o gato lhe arranhou de propósito o seu olho doente.

Ocorreram sentimentos contraditórios na cachorra-gato. Enquanto, a parte traseira de Pipoca tremia, e até lhe escapou um pouquinho de xixi, a parte da gata Sabá sentia indiferença por aquele reles gato mortal. Ela já estava entediada de ficar ali parada olhando a paisagem. Então, a gata percebeu que podia tirar vantagem da situação e fazer alguma arte que só gatos etéreos inventam. E afinal, qualquer brincadeira estava valendo para acabar com o tédio de ter uma cachorra velha e ansiosa acoplada em seu traseiro.

Sabá olhou para o gato siamês do outro lado da rua e lhe mandou uma miada irresistivelmente sedutora. O siamês levantou as orelhas, eriçou os pelos das costas e seguiu confiante para o portão da casa de Pipoca. O gato começou a passar seu corpo rente a grade do portão se oferendo para a gata preta. Sabá, mais sedutora que nunca, continuou incentivando a investida do gato siamês. Enquanto que Pipoca se mantinha paralisada pelo medo.

O clímax de seu desespero foi quando o siamês deu uma lambida na cara de Sabá. Nesse momento, Pipoca não aguentou e latiu forte. O gato sem entender o que havia acontecido, saiu meio correndo, meio rolando e morrendo de medo. Deve ter ficado pensando que diabo de gata late como cachorro brabo?

A brincadeira foi boa. Pipoca conseguiu se vingar do gato siamês. E Sabá pode aprontar algo menos sério que as suas costumeiras missões das sextas-feiras de luas específicas. O bom mesmo, é que o efeito do feitiço transformador passou logo. Pipoca voltou a ser ela mesmo e Sabá regressou para a outra dimensão onde vive.


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