Texto/Poesia - Nefele: Nuvem-Mulher
- Alex Fraga
- 10 de abr.
- 2 min de leitura

Quinta-feira no Blog do Alex Fraga é dia de texto/poesia com a escritora e poeta de Campo Grande (MS), Raquel Naveira, com Nefle: Nuvem-Mulher.
NEFELE: NUVEM-MULHER
Raquel Naveira
Os poetas simbolistas eram chamados de “nefelibatas”. Essa palavra tem origem no mito greco-romano de “Nefele”, nuvem mágica à qual Júpiter deu a forma da deusa Juno para enganar e punir Ixião.
Ixião foi rei dos lápitas, na Tessália. Após ter esposado Dia, filha do rei Deioneu, recusou ao soberano os ricos presentes que lhe havia prometido e acabou por matá-lo, lançando-o num fosso cheio de brasas. Culpado de perjúrio e sacrilégio por ter matado um parente, Ixião despertou o horror e o desprezo de todos. Júpiter, comovido com suas lamentações, levou-o ao Olimpo, serviu-lhe néctar e ambrosia e conferiu-lhe imortalidade. Mas Ixião, traidor por natureza, tentou seduzir Juno, esposa de Júpiter. Júpiter então criou uma nuvem com a forma da deusa. Ixião uniu-se a essa nuvem, dando origem aos centauros.
Pensando nessa história surpreendente de uma nuvem-mulher, criei este poema:
Nefele, nuvem mágica
Em forma de mulher,
Nem era mulher,
Mas gerou os centauros
Que cavalgaram loucos
Pelos campos.
Nefele nem era mulher,
Era nuvem de água e gelo,
Envolta em névoa.
Nefele,
Vago por realidades inefáveis,
Nebulosas;
Meus emblemas são a Via Láctea,
O véu da noiva,
A estrela polar,
A neve.
Oculto-me numa nuvem,
A nuvem é meu disfarce,
Sou a própria nuvem
Vista pela outra face.
Alma de poeta,
À cata de símbolos,
Nefelibata.
Dizem que o poeta vive nas nuvens ou trancafiado numa “torre de marfim”; que, dominado por um suposto ideal, não dá atenção aos fatos do cotidiano nem às lições da experiência. O poeta pode parecer distraído, desatento, mas, na verdade, ele está concentrado em coisas que ninguém observa ou dá valor, a não ser ele próprio. Esforça-se para apreender o impalpável, vive em busca do signo, que é o sinal luminoso duma complexa realidade espiritual, com a qual ele se comunica. É assim que o poeta pode se tornar porta-voz de multidões inteiras: verbalizando o que os outros não conseguem captar.
Sou mulher, meio nuvem, meio Nefele. Cultivo o Vago, o Oculto, o Mistério, a Ilusão, a Solidão que me permitem sondar além das aparências do concreto tangível, num mundo de névoas e ideias.
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